Cegueira ou não cegueira
já não observo o meu rosto ao espelho
conheço de cor todas as manchas que me cobrem a pele
navego nas suas rugas vincadas e sou um naufrago na tua boca
se eu me olhar no espelho
sei do pó que me cobre a face:
é o mesmo que resta da longa espera
talvez encontre uma saída
talvez parta o espelho em milhões de formas geométricas, sem forma
já não reconheço o crânio e a pele que o cobre,
todos os vasos sanguíneos onde ainda circula o sangue,
a boca seca, fechada
o nariz dilatado
talvez os polegares me cubram as orbitas
onde deviam estar os olhos
e eu descubra dois fossos vazios
Marcantonio, Cinco Monotipias 2001
«Escrever não é agradável. É um trabalho duro e sofre-se muito. Por momentos, sentimo-nos incapazes: a sensação de fracasso é enorme e isso significa que não há sentimento de satisfação ou de triunfo. Porém, o problema é pior se não escrever: sinto-me perdido. Se não escrever, sinto que a minha vida carece de sentido.»
de Paul Auster
"Saber que será má uma obra que se não fará nunca. Pior, porém, será a que nunca se fizer. Aquela que se faz, ao menos, fica feita. Será pobre mas existe, como a planta mesquinha no vaso único da minha vizinha aleijada. […] O que escrevo, e que reconheço mau, pode também dar uns momentos de distracção de pior a um ou outro espírito magoado ou triste. Tanto me basta, ou não me basta, mas serve de alguma maneira, e assim é toda a vida."
de Bernardo Soares
os olhos enganam, laurita. procura ver o essencial para além da sua órbita e nenhum espelho se fará mais necessário do que o lixo que se nos cola nos sapatos.
ResponderEliminarbeijo grande!
Laura, só não concordo que a minha imagem, ou qualquer outra que você aqui utilize, confira maior dignidade ao que você escreve. Elas não podem senão ser arrastadas pelo fluxo extremamente pessoal das sua palavras.
ResponderEliminarBeijo.