[Fotografia de Laura Alberto]
conquistamos a calçada suja
com os nossos passos sem rumo,
debaixo de estações que nos escorreram pela pele:
o sol que nos traçou linhas no rosto
a chuva que nos matou a sede
tomamos a cidade nossa, construímos casas
com flores roubadas dos jardins:
eu esperava por ti no meio da rua ao som de apitos
tu encontravas-me sempre na minha mesa no café
e juntos fumávamos um só cigarro
hoje, estou na tua rua, à tua porta:
tua casa é agora um prédio devoluto
onde nem os pássaros lhe pousam,
restam poucos vidros nas janelas
e das cortinas já nem a cor se lhes conhece
os jardins foram substituídos por granito
uma extensa língua de paralelos a unir os extremos
e nem uma erva cresce nos espaços ínfimos
a paragem já não existe
os bancos de madeira foram removidos,
substituídos por cadeiras individuais de ferro
as estátuas são as mesmas, frias, inertes,
mortas
e o relógio bem que podia ter parado
não volto aqui, sem saber
o
nome dos versos que escreveste
na concha das tuas mãos