«Escrever não é agradável. É um trabalho duro e sofre-se muito. Por momentos, sentimo-nos incapazes: a sensação de fracasso é enorme e isso significa que não há sentimento de satisfação ou de triunfo. Porém, o problema é pior se não escrever: sinto-me perdido. Se não escrever, sinto que a minha vida carece de sentido.»
de Paul Auster
"Saber que será má uma obra que se não fará nunca. Pior, porém, será a que nunca se fizer. Aquela que se faz, ao menos, fica feita. Será pobre mas existe, como a planta mesquinha no vaso único da minha vizinha aleijada. […] O que escrevo, e que reconheço mau, pode também dar uns momentos de distracção de pior a um ou outro espírito magoado ou triste. Tanto me basta, ou não me basta, mas serve de alguma maneira, e assim é toda a vida."
de Bernardo Soares

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Escrevi-te um poema nas asas do vento,
A quem pedi que fosse mensageiro.
Elevaram-se as palavras no céu,
Para que do teu refugio o percebesses.

Roubei a voz dos animais,
Esperando que no silêncio o ouvisses.
Apaguei a luz do sol,
Desejando que na escuridão o visses.

Despertei na fria madrugada,
Procurando em vão a réplica que viesse.
Adormeci na solidão da noite,
Em ânsia que o sonho se realizasse.

Cobri o sonho com uma manta de estrelas,
Iluminando o abismo que me deixaste.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Pedi a Ícaro as suas asas,
Para que pudesse voar no céu alto.
Iludi-me pensando avistar-te,
Pequena grande criatura.

Subi entre nuvens de esperança,
Viajando entre raios ténue luz,
Fugia daqueles todos,
Procurava encontrar-te a ti.

Corri os cantos do globo,
Bradando o teu nome,
Mas quem me ouviu não me percebeu,
E quem me percebia, não me quis ouvir.

Teimosamente escrevi teu nome,
Que se perdeu nas malhas do tempo.
Naquela tarde encontro-me aí.
Exactamente no local estranho daqui.
Nesta hora estava por ali,
Precisamente no tempo daí.
Num segundo descobri-me daqui,
Perdida do tempo aí.
Num estranho minuto vi-me aqui,
Em fuga incessante daí.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Uma gota de água fugiu ao oceano,
Veloz entre as teias dos átomos,
Contrariando o ininterrupto ciclo,
Numa provocação do inevitável.

Toda aquela água concentrada numa gota,
Em fúria galgando os imensos rochedos,
Numa procura da distante foz,
Escondida nos mapas da história.

Humilde respingo de água
Seguindo o curso do leito devido,
No cumprimento rigoroso do ordenante,
Conhecedor da engrenagem do Universo.

Simples gotícula de água obedecendo,
Em silêncio prevenindo,
A derrocada fortuita.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Quando

Desejo silenciosamente uma noite de Verão.
Para que no silêncio do quarto verde,
Um sardão laranja veja subir pela parede.

Amanhã será Inverno,
Para que no barulho do quarto azul,
Corra a aranha roxa, encerrada no seu canto.

Ontem foi Outono,
Uma triste borboleta vermelha
Transpôs a janela, de encontro ao solo.

Não me lembro quando foi Primavera,
E o Universo era infinito.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Mensagem

A neve alva cobriu as searas numa noite de Verão.
Chamando a si a mudança temida.
A luz-guia do náufrago errante,
Apagou-se no luar de Janeiro.
O que dormia acordado,
Despertou nas trevas da luz.

Os mortais consultaram os oráculos.
Iludindo a lição sabida,
Fintando a certeza do destino.

O delta inundou-se de água fecunda,
Concebendo o futuro.
Os barcos naufragados desfraldaram as velas
Ao sabor do vento.
As ruínas ergueram-se em cidades

Os oráculos testemunhavam o futuro.
Escrevendo esperança
No trilho a seguir

O Ser sucumbiu perante o homem,
O Homem foi assassinado pelo ser.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Futuro

Não morri.
Arrisquei a resistência do cinzento granito.
Não desisti.
Afinquei em solo firme.
Não desesperei.
Colhi o fruto da insistência.

Chorei, sim.
Limpando o pó dos olhos.
Sim, caí.
Para compreender.

Sim, morri sim.
Para renascer.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009