Fotografia de António Nunes
hoje acordei com nicotina nos lábios e a garrafa entornada ao lado da cama.
o espelho tem a face queimada pelas linhas brancas que embaciam o olhar.
Ah, inspiração, és o sexo do poeta guardado pelo trifauce da obscuridade. é verdade, procurei seduzi-lo, comprar o poema, vender-lhe o corpo – a sobrevivência da plêiade é aquela côdea de pão bolorento que serve de festim às moscas. mas a ambição do inferno é apenas um balde negro e vazio que nem a faísca do olhar prostituto consegue acender.
não soube encontrar o fogo dentro de casa, mas a pólvora persiste em bordejar as pontas dos dedos enquanto o corpo áspero é muito menos que lixa a aguardar pela fricção. não havia fogo cá em casa mas todo o homem é o seu poema, mesmo que inflamável.
malditas, malditas que escorrem negras pela face, as letras que fogem aos dedos entorpecidos, moribundos sobre o papel!
malditas, malditas que me roubam as horas dos dias, as horas das noites!
e a corda enrola-se no pescoço, aperta a pele, comprime os músculos e o sangue em golfadas, pelas veias, assassina as palavras sobre a areia imunda.
às escuras, adivinho a sentença. sei que preciso do meu castigo no intervalo do meu desejo, no interlúdio da minha peça, nas letras vazias do meu poema. mas a música deixou de me tocar e os deuses, do alto da sua torre, mijaram-me em cima.
nunca vos tinha lido em prosa, só posso dizer obrigada por me inspirarem,
ResponderEliminarpor me libertarem do casulo monotono que as palavras me nascem nos lábios e nas mãos, não as saberei nunca libertar, mas ainda assim é tão bom lê-las como por vezes as sinto.
e de rouquidão tão densa, penso jamais me vou livrar deste silêncio, malditas palavras, raios as partam!
beijinhos a ambos :-)
comentei no viagem sobre o poeta brasileiro Augusto dos Anjos que disse "um urubu pousou na minha sorte", quanto ao mijo divinal há que se celebrar em chuva,
ResponderEliminarbeijo Laura
laurita,
ResponderEliminarantes da escrita já existia a amizade. as mãos tocam-se bem acima da tinta.
escrever contigo é, para mim, um acontecimento.
um abraço!
Saudações, Laura,
ResponderEliminardeixarei aqui a mesma impressão que deixei lá no Viagens de luz e sombra
seus poemas, suas poesias, seus textos são de uma profundidade, são palavras que rasgam veias e peles e expõem o sangue e a carne viva em seus escritos e mais ainda quando se juntam às do Jorge, são as entranhas expostas em belas e tocantes composições.
Abraços a vocês