O despertador não tocou, porque o
meu relógio biológico, vá-se lá saber o porquê, leva-me a acordar sempre uns
minutos antes da hora.
Entre o preparar das coisas,
arranjar o petiz e arranjar-me, saio, como sempre a correr, para enfrentar mais
uma hora e cinco de alcatrão e chegar à escola.
Enfrento as estradas nacionais,
municipais, quelhas e no fim de tudo isto, do lado esquerdo, o edifício
cor-de-rosa. Chego à escola. A primeira reunião.
Posso respirar, posso respirar
porque estou viva, mas não posso respirar de alívio. Hoje, não sei quantos
professores contratados, dizem na comunicação social mais de três mil, ou três
mil e quinhentos, dirigem-se para fazer uma prova, grande parte deles, morreram
a ver a linha da praia, por alguns dias são obrigados a fazer esta prova
absurda.
Depois dos inquéritos de opinião,
nalguns canais de rádio, grande parte da população é favorável a que seja feita
esta prova a todos os professores, quer contratados, quer do quadro. A ser
assim, até poderia estar de acordo, poderia, mas não estaria. Tal como não
estou agora.
Termina a primeira reunião,
depois de toda a papelada e burocracia, os colegas saem com um sorriso nos lábios.
A mim é me impossível sequer mexer os lábios. Não sei quantos professores fizeram
a prova, ou se esta virá a ter algum valor no final. Penso nos colegas que,
após anos nas universidades e nas escolas, como contratados, muitas vezes
olhados de lado e como professores de segunda, coisa que eu já senti na pele e
às vezes ainda sinto, foram sujeitos a esta pressão.
Partilhei quatro anos com uma
colega que suponho estará a fazer a prova. Nesses anos, partilhamos material,
experiências, dinamizamos actividades experimentais para os alunos. Eu, com
mais de doze anos de tempo de serviço nunca me senti de algum modo mais
profissional do que a minha colega de grupo. E agora eu posso escapar ilesa e
ela não, injustamente.
Que os professores devem todos
ser avaliados? Sim, nós contratados somos avaliados todos os anos.
Que os professores devem fazer
formação? Sim, nós fazemos formação nos centros de formação das escolas onde leccionamos.
Que os professores estão sentados
nas suas cadeiras acomodados? Sim, nós enfrentamos estradas, longas viagens,
alguns são obrigados a mudar de casa, deixar a família.
Que os professores só fazem greve
e têm férias? Sim, neste momento estamos todos em casa, as aulas acabaram e nós
estamos de férias. Não temos reuniões de avaliação, não temos formações, não
temos serviço nas escolas até ao dia 6 de Janeiro.
Que todos os professores devem
fazer a prova? É um país democrático, pensem por vocês.
Nós apenas estamos cansados de
fazer tudo para conseguir um lugar no ensino, em agosto vivermos o pesadelo do
desemprego e passar os meses que se seguem entre visitas obrigatórias à junta
de freguesia, listas onde o nosso nome teima em não aparecer e entrevistas
onde, algumas vezes, somos enxovalhados.
Venha a próxima reunião.
Marco de Canaveses, 18 de Dezembro de 2013
Esta crónica é escrita com o
antigo acordo ortográfico. Prendam-me
Laura,
ResponderEliminarPartilho dessa revolta, dessa náusea de estarmos entregues a um bando de mafarricos aprendizes.
Dignidade, por onde andas?
Beijo :)