«Escrever não é agradável. É um trabalho duro e sofre-se muito. Por momentos, sentimo-nos incapazes: a sensação de fracasso é enorme e isso significa que não há sentimento de satisfação ou de triunfo. Porém, o problema é pior se não escrever: sinto-me perdido. Se não escrever, sinto que a minha vida carece de sentido.»
de Paul Auster
"Saber que será má uma obra que se não fará nunca. Pior, porém, será a que nunca se fizer. Aquela que se faz, ao menos, fica feita. Será pobre mas existe, como a planta mesquinha no vaso único da minha vizinha aleijada. […] O que escrevo, e que reconheço mau, pode também dar uns momentos de distracção de pior a um ou outro espírito magoado ou triste. Tanto me basta, ou não me basta, mas serve de alguma maneira, e assim é toda a vida."
de Bernardo Soares

terça-feira, 20 de julho de 2010

Manifesto XIX

autópsiAR

daqui a uns dias pinto o cabelo de ruivo,

acabaria deitada na mesa de inox,
omoplatas relaxadas no frio das tuas mãos,
o cessar da dança do diafragma,

odor a desinfectante esparramado nos pulmões,
músculos contraídos à espreita do bisturi,
olhos fixos nas paredes de mármore,

daqui a uns dias vou ter frio,

acabaria à espera:
da gaveta frigorifica,
da etiqueta sem nome,
sem ti


Fotografia de Jorge Molder

7 comentários:

  1. gélido o clima, lembrou-me Hell Freezes Over do Eagles, assim como o inferno congelado,


    abraço

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  2. Laura! Chega a enregelar as pálpebras! Das relações espelhadas entre amor e morte? Himeneu & morgue. Impossível ficar indiferente.

    Abraço.

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  3. Assis, sempre boa a sua visita aqui! Estamos no Verão, mas para mim parece que continua o Inverno!
    Beijo

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  4. Marcantonio, por vezes penso que o amor é mesmo isso, o preludio da morte.
    Beijo

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  5. Uau, adoro o impacto misturado com o lirismo que seus poemas nos oferecem!

    Abraço.

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  6. demasiadamente branca, essa gaveta frigorífica... atira-lhe alcatrão e faz a estrada; lança-lhe petróleo e prossegue a viagem. se incendiar... deixa arder.
    um beijo, laurita!

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  7. Não posso deixar de dizer que este poema enregelou-me até a alma. Talvez seja a mesa de inox que te está a arrefecer de mais. Não será altura de fazer uma decoração nova na casa?

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