«Escrever não é agradável. É um trabalho duro e sofre-se muito. Por momentos, sentimo-nos incapazes: a sensação de fracasso é enorme e isso significa que não há sentimento de satisfação ou de triunfo. Porém, o problema é pior se não escrever: sinto-me perdido. Se não escrever, sinto que a minha vida carece de sentido.»
de Paul Auster
"Saber que será má uma obra que se não fará nunca. Pior, porém, será a que nunca se fizer. Aquela que se faz, ao menos, fica feita. Será pobre mas existe, como a planta mesquinha no vaso único da minha vizinha aleijada. […] O que escrevo, e que reconheço mau, pode também dar uns momentos de distracção de pior a um ou outro espírito magoado ou triste. Tanto me basta, ou não me basta, mas serve de alguma maneira, e assim é toda a vida."
de Bernardo Soares

terça-feira, 13 de julho de 2010

Manifesto XV

Necrologia

observas-te no espelho frio,
carcaça despojada de entranhas,
(quero dizer, de coração)
um golpe no abdómen liberta
o cheiro nauseabundo do teu íntimo,
(quero dizer…)
mais um corte no costado,
caem as falsas asas,
(quero dizer…)

pintas um retrato no vegetal enegrecido,
esqueleto de ossos quebrados,
(quero dizer, violentados)
um toque na estrutura de aço,
fogem os vermes da podridão,
(quero dizer…)
martelo pneumático no cérebro
solta-se a cobardia,
(quero dizer…)

quero te!
ler,
na página do jornal…


Marcantonio, Melancolia 40, Técnica Mista, 154×90 cm, Rio de Janeiro, 2006

2 comentários:

  1. Há um poema de silêncio entremeando o outro...Sentidos invisíveis escorrendo sobre as letras: gosto disso!
    Abraços,
    Tânia

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  2. a densidade das emoções na fúria das palavras sempre orientadas para um referente sanguíneo. basta-lhe a mão sobre o peito para tudo desabar num castelo de areia...
    um beijo, amiga!

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