«Escrever não é agradável. É um trabalho duro e sofre-se muito. Por momentos, sentimo-nos incapazes: a sensação de fracasso é enorme e isso significa que não há sentimento de satisfação ou de triunfo. Porém, o problema é pior se não escrever: sinto-me perdido. Se não escrever, sinto que a minha vida carece de sentido.»
de Paul Auster
"Saber que será má uma obra que se não fará nunca. Pior, porém, será a que nunca se fizer. Aquela que se faz, ao menos, fica feita. Será pobre mas existe, como a planta mesquinha no vaso único da minha vizinha aleijada. […] O que escrevo, e que reconheço mau, pode também dar uns momentos de distracção de pior a um ou outro espírito magoado ou triste. Tanto me basta, ou não me basta, mas serve de alguma maneira, e assim é toda a vida."
de Bernardo Soares

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Polaroid 21

Prostituta na beira da estrada

podia chamar-se Maria ou Madalena, ou até mesmo Maria Madalena. passo e não sei o seu nome, nunca o ouvi porque também nunca ninguém o ousou pronunciar. e eu passo, ao longo da estreita língua de alcatrão, ladeada por muros, que foram muros e agora são ruínas. e passo, todos os dias à mesma hora, sempre atrasada, a correr, entre a língua de alcatrão, os muros e os pinheiros que se agitam a minha passagem. a sua figura de estátua decadente, imóvel, na intersecção de duas estradas sinuosas, com a humidade que escorre entre as agulhas do abandono. passo com os olhos na rotunda, depois da última curva, apertada para a esquerda.
um dia acenei-lhe, um olá, um adeus. e porque não? se até as árvores me devolvem o vento que trago, e porque não?

2 comentários:

  1. belíssimo, amiga. o final, então...
    os sinais do vento são de uma eloquência atroz.
    beijos!

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  2. voltei aqui, já o reli várias vezes não me canso...

    "até as árvores me devolvem o vento que trago"

    Beijo Laura!

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