«Escrever não é agradável. É um trabalho duro e sofre-se muito. Por momentos, sentimo-nos incapazes: a sensação de fracasso é enorme e isso significa que não há sentimento de satisfação ou de triunfo. Porém, o problema é pior se não escrever: sinto-me perdido. Se não escrever, sinto que a minha vida carece de sentido.»
de Paul Auster
"Saber que será má uma obra que se não fará nunca. Pior, porém, será a que nunca se fizer. Aquela que se faz, ao menos, fica feita. Será pobre mas existe, como a planta mesquinha no vaso único da minha vizinha aleijada. […] O que escrevo, e que reconheço mau, pode também dar uns momentos de distracção de pior a um ou outro espírito magoado ou triste. Tanto me basta, ou não me basta, mas serve de alguma maneira, e assim é toda a vida."
de Bernardo Soares

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Manifesto C

De manhã

quando acordei, procurei o teu corpo:
os lençóis estavam frios
os vincos tinham desaparecido nos dias
que escorriam em gotas de água nas janelas fechadas

tossi, precisava de cortar o silêncio,
saber que estava ali
prisioneira, como o ar pesado
que descia do tecto, sobre o candeeiro apagado

quando me levantei, não senti os meus pés
nos teus pés, não me mexi, não tropecei
nos novelos de pó que se acumulavam
sobre as tábuas do quarto

falei, baixo, muito baixo, alto
e o eco rodeou-me o peito, apertou-o
apertou-o forte, até que os ossos se partiram
e era finalmente a noite





Fotografia de Pedro Polónio, http://club-silencio.blogspot.com/

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