«Escrever não é agradável. É um trabalho duro e sofre-se muito. Por momentos, sentimo-nos incapazes: a sensação de fracasso é enorme e isso significa que não há sentimento de satisfação ou de triunfo. Porém, o problema é pior se não escrever: sinto-me perdido. Se não escrever, sinto que a minha vida carece de sentido.»
de Paul Auster
"Saber que será má uma obra que se não fará nunca. Pior, porém, será a que nunca se fizer. Aquela que se faz, ao menos, fica feita. Será pobre mas existe, como a planta mesquinha no vaso único da minha vizinha aleijada. […] O que escrevo, e que reconheço mau, pode também dar uns momentos de distracção de pior a um ou outro espírito magoado ou triste. Tanto me basta, ou não me basta, mas serve de alguma maneira, e assim é toda a vida."
de Bernardo Soares

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Lugares


Fotografia de Pedro Polónio, http://club-silencio.blogspot.com/

trago-te sempre às costas
e como eu gosto dos teus dedos.
suspiro quando percorrem a minha coluna,
brincam violentamente com a espinha
nos lugares onde as metáforas fazem ninho.

as costas são o litoral do corpo.
estendem ímanes sobre as mãos
e todos os frutos silvestres por roer
mesmo se nenhum de nós sabe o jogo
onde se lançam dados viciados,
mesmo se nenhum de nós sabe o fogo
onde navegam os deuses alados.

e eu quero perder-me
aí, onde os mapas se rasgam ao vento
e a areia molda os nossos corpos
[e quero que passes, quero que fiques].
e eu quero perder-me
aí, na tempestade das pernas
e na orla dos joelhos que ardem
e quero fugir, quero ficar].

se mergulhar um dia
sei que não vou ficar, aí
[as horas lentas
escorrem pelas paredes
mancham os lençóis].

se cair um dia
sei que não voltarás, aqui
[o pássaro será de papel
girando em órbitas de giz
atadas às linhas da tua mão].

e esse espaço que o teu corpo ocupa
jamais será meu.

laura alberto & jorge pimenta


Legendary Tiger Man "Life Aint Enough For You"

3 comentários:

  1. Poema maravilhoso!
    Sensibilidade pura em cada palavra.
    Parabéns!

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  2. amiga,
    quando penso nos passos que cruzámos e descruzámos desde viatodos, emcontro motivo para crer que nem sempre o que não parece não é :)
    a doida radical e o pedante inchado, com tamanho de sapatos tão diferente, haveriam de descobrir, por debaixo das solas do tecido social tantas afinidades em áreas tão essenciais à construção do edifício humano: na música, no cinema, na literatura (lida e escrita), na comunicação, nos detalhes, nas pedras de lugares, no jornalismo escolar, nos ideais pedagógicos...
    laurinha, seja em viatodos, em freamunde, ou na china, o essencial não conhece distância.
    beijos!

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  3. eu me deixei quedar "nos lugares onde as metáforas fazem ninho". o verbo tece, afia e rodopia. qual o limite das águas?

    beijo e abraço

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