«Escrever não é agradável. É um trabalho duro e sofre-se muito. Por momentos, sentimo-nos incapazes: a sensação de fracasso é enorme e isso significa que não há sentimento de satisfação ou de triunfo. Porém, o problema é pior se não escrever: sinto-me perdido. Se não escrever, sinto que a minha vida carece de sentido.»
de Paul Auster
"Saber que será má uma obra que se não fará nunca. Pior, porém, será a que nunca se fizer. Aquela que se faz, ao menos, fica feita. Será pobre mas existe, como a planta mesquinha no vaso único da minha vizinha aleijada. […] O que escrevo, e que reconheço mau, pode também dar uns momentos de distracção de pior a um ou outro espírito magoado ou triste. Tanto me basta, ou não me basta, mas serve de alguma maneira, e assim é toda a vida."
de Bernardo Soares

quinta-feira, 13 de outubro de 2011


Salvador Dali e Gala

[cheguei cedo, cheguei cedo de mais]

sento-me numa das frias cadeiras de metal que aqueço com o corpo

à minha volta, um cortejo de pessoas: que esperam, que partem, que chegam, que não chegam, que tarde chegam, que desesperam

nenhum daqueles olhares é me conhecido, nenhum daqueles olhares me devolve um porto de abrigo

deixo-me embalar pelos corpos que dobram a esquina tentando equilibrar malas nas mãos e na dobra do cotovelo

adormeço ao som de peles queimadas, de peles brancas, de peles cansadas, de peles ansiosas, de crianças que correm e choram e riem, como é esperado de quem é criança

quando finalmente é o teu corpo que se destaca na multidão, reconheço a tua face, a tua boca, o teu olhar perdido e distante

[quanto tempo se passou?]

não espero resposta, ela surge nas rugas que agora aparecem quando sorris, quando franzes as sobrancelhas, desconfiado
[ainda a tens?]

levo a tua mão ao meu ombro, não preciso de responder porque acabaste de a sentir

[anda, vamos]
finalmente posso pousar a cabeça no teu colo

[tu sabes que eu gosto de vir aqui de vez em quando]
[sei, porque aqui nós conhecemo-nos ]

(cont....)

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