«Escrever não é agradável. É um trabalho duro e sofre-se muito. Por momentos, sentimo-nos incapazes: a sensação de fracasso é enorme e isso significa que não há sentimento de satisfação ou de triunfo. Porém, o problema é pior se não escrever: sinto-me perdido. Se não escrever, sinto que a minha vida carece de sentido.»
de Paul Auster
"Saber que será má uma obra que se não fará nunca. Pior, porém, será a que nunca se fizer. Aquela que se faz, ao menos, fica feita. Será pobre mas existe, como a planta mesquinha no vaso único da minha vizinha aleijada. […] O que escrevo, e que reconheço mau, pode também dar uns momentos de distracção de pior a um ou outro espírito magoado ou triste. Tanto me basta, ou não me basta, mas serve de alguma maneira, e assim é toda a vida."
de Bernardo Soares

domingo, 20 de maio de 2012

purgatorium XXVI

Uma cortina desce pesarosamente, tingindo o meu olhar com a sua cor: cor de sangue, cor de sonhos abatidos um a um, cor de lágrimas secas dentro dos olhos, cor dos abortos do tempo, cor do dia que se acerca da porta.
É inútil ignorar e fugir seria uma atitude mentecapta. O amanhã foi minuciosamente traçado ao longo de todos os dias que o antecederam. Cada passo foi sempre dado para alcançar o dia de amanhã. Que sei eu ainda? E fugir? Fugir para onde?
Há uma bala guardada, algures, com o meu nome gravado.
 

9 comentários:

  1. A sua escrita me acerta em cheio, como essa bala. Me identifico tanto com o que escreves, como se fosse para mim, como se eu houvesse escrito. É tão bom nos ler em alguém, pq há aquela sensação de conforto, mesmo no caos que certos poemas representam. É como uma mão estendida, para aturarmos juntos o tufão.

    Beijo grande, flor.

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  2. Laurinha,
    alguns passos não conseguem definir o amanhã, eles próprios são o amanhã à espera da bala guardada com o nome certo.

    Lindo teus 'purgatorium'!
    Adoro essa série!

    Beijinhos e ótima semana!

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  3. meus olhos se cobriram com o pano da verdade, Laurinha... quase mortalha!

    Beijinho, querida!

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  4. O corpo persegue a bala, assim, não há fuga para o hoje, nem para o amanhã.
    Sou tua fãzoca!!!!
    Bj gigante

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  5. [ainda assim, ficam guardadas as balas de prata, e o quanto me seriam gratos se pudessem ser meus e não do Sérgio Godinho, estes para aqui deixar, do Tantas Vezes Fui à Guerra:

    «Só me rendo, quando muito
    quando a morte me atingir
    a minha bandeira branca
    é o lençol que me cobrir
    Nem aos deuses nem à morte
    peço perdão do que fiz
    já suporto bem a dor
    já só quero é ser feliz.»

    ... e ainda assim os deixo.]

    como a esse imenso abraço, Laura

    Leonardo B.

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  6. E se estiveres enganada?
    E se não houver nada traçado para o amanhã?
    O destino não existe. Em boa medida, fazemo-lo nós... O único destino certo é a morte, já prevista desde que nascemos...
    Gostei do teu texto. É excepcionalmente bom. Parabéns.
    Beijo, querida amiga.

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  7. "Há uma bala guardada, algures, com o meu nome gravado." Que frase forte! Talvez haja, mas quem escreve assim, consegue esquivar-se às balas!
    Beijos, boa semana!

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  8. Tantas balas que guardamos para detonarmos contra nós mesmos!Quantos tiros pela culatra...!?

    beijoss

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  9. Sempre há uma bala guardada para o hoje ou amanhã.

    bjs

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