«Escrever não é agradável. É um trabalho duro e sofre-se muito. Por momentos, sentimo-nos incapazes: a sensação de fracasso é enorme e isso significa que não há sentimento de satisfação ou de triunfo. Porém, o problema é pior se não escrever: sinto-me perdido. Se não escrever, sinto que a minha vida carece de sentido.»
de Paul Auster
"Saber que será má uma obra que se não fará nunca. Pior, porém, será a que nunca se fizer. Aquela que se faz, ao menos, fica feita. Será pobre mas existe, como a planta mesquinha no vaso único da minha vizinha aleijada. […] O que escrevo, e que reconheço mau, pode também dar uns momentos de distracção de pior a um ou outro espírito magoado ou triste. Tanto me basta, ou não me basta, mas serve de alguma maneira, e assim é toda a vida."
de Bernardo Soares

terça-feira, 26 de junho de 2012

Polaroid 54

fêmea 


talvez traga a noite encarcerada no peito,
os pesadelos emaranhados no cabelo
e o vento tenha deixado cicatrizes na pele


mas hoje prometo-te que não beberei
desse meu veneno moroso,
visto o vestido de seda que me ofertaste
disfarço as olheiras, alinho os cabelos
embebedo o corpo de perfume
encho o copo e espero te


talvez esteja condenada
a dias sombrios, gelados e densos,
as trevas como companhia única


quando chegares serei carne, a tua carne
seremos carne arrefecida pela espera
feridas secas que ardem debaixo do teu corpo em chamas


[trespassa-me com a língua, viola as pétalas que existem em mim
canso-me com facilidade de ser um trapo de cor]


 

9 comentários:

  1. talvez uma taça de vinho
    seja a melhor companhia
    desse poema que dança
    entre meus cílios
    ...

    lindo, lindo, lindo
    ...

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  2. porque o corpo vicia-se carne...que seja saciado!!

    beijinho, querida amiga intensa!!

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  3. as vezes esse despedaçamento, esse esfarelar-se é um modo de nos darmos ao mundo/ ao outro - deve ser por isso que a tua escrita é tão dolorida - um modo de se entregar ao outro (só pensamentos)

    um beijo

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  4. Laurinha,
    sou adepta da iconoclasia. Acredito que o destruir pode levar ao reconstruir, definitivamente.

    Beijos!

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  5. Cada verso, uma ferida aberta, o poeta cola as peles do poema, apenas para que ele possa rasgá-las outra vez.
    Não cansarei de dizer: Em todos os blogs que visito, nenhuma escrita se aproxima tanto de mim quanto a tua. Devo isso ao meu mega querido Jorgito.
    Bj imenso, poetaça!

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  6. Um corpo em chamas numa noite fria à espera daquela que quer ser carne para preencher a alma vazia. E mais uma vez parabéns pelo seu gosto musical. Sempre dicas muito boas!

    Bjos

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  7. como admiro a tua escrita...
    beijo, Laura

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  8. nenhuma cor, nenhuma tela, nenhuma mão se fazem eternos. é na memória que tudo vive... enquanto ela viva.


    beijos, laura!

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  9. Nem se importa com a entrega de ser mais uma vez um trapo.

    Bjs.

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