«Escrever não é agradável. É um trabalho duro e sofre-se muito. Por momentos, sentimo-nos incapazes: a sensação de fracasso é enorme e isso significa que não há sentimento de satisfação ou de triunfo. Porém, o problema é pior se não escrever: sinto-me perdido. Se não escrever, sinto que a minha vida carece de sentido.»
de Paul Auster
"Saber que será má uma obra que se não fará nunca. Pior, porém, será a que nunca se fizer. Aquela que se faz, ao menos, fica feita. Será pobre mas existe, como a planta mesquinha no vaso único da minha vizinha aleijada. […] O que escrevo, e que reconheço mau, pode também dar uns momentos de distracção de pior a um ou outro espírito magoado ou triste. Tanto me basta, ou não me basta, mas serve de alguma maneira, e assim é toda a vida."
de Bernardo Soares

sábado, 28 de agosto de 2010

Desconhecido

I

Um mês
E outros mais,
Incontáveis.

Estão os lençóis dobrados,
Descansando sobre uma cama vazia.
Oscilam os cabides do corpo,
Esquecidos da carne que os vestiu.
Tenteia a língua o céu da boca,
Seca do sangue sumido nas traves do chão.

II

Outro mês
E um mês mais,
Imensuráveis.

E hoje que acordei,
Sem vontade de ter vontade,
Com desejo de não desejar.

E hoje que acordei,
Sem o teu corpo cá,
Com o meu corpo cá.

E hoje que acordei,
Com o espelho partido,
Sem sentido de um reflexo qualquer.

III

Deite-se o Homem,
Que as ondas já se arrastam,
Pelas línguas do tempo.

Deite-se o Homem,
Enquanto desenha a espuma,
Os olhos no sargaço.

Deite-se o Homem,
A enxada cobre as pedras,
Com a areia do tempo.

1 comentário:

  1. deite-se o homem... mas cumpra-se antes de se extinguir nos cabides do tempo.
    um abraço, amiga!

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