«Escrever não é agradável. É um trabalho duro e sofre-se muito. Por momentos, sentimo-nos incapazes: a sensação de fracasso é enorme e isso significa que não há sentimento de satisfação ou de triunfo. Porém, o problema é pior se não escrever: sinto-me perdido. Se não escrever, sinto que a minha vida carece de sentido.»
de Paul Auster
"Saber que será má uma obra que se não fará nunca. Pior, porém, será a que nunca se fizer. Aquela que se faz, ao menos, fica feita. Será pobre mas existe, como a planta mesquinha no vaso único da minha vizinha aleijada. […] O que escrevo, e que reconheço mau, pode também dar uns momentos de distracção de pior a um ou outro espírito magoado ou triste. Tanto me basta, ou não me basta, mas serve de alguma maneira, e assim é toda a vida."
de Bernardo Soares

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

balada XX


olhou para ela de soslaio, pelo canto do olho
esvoaçava em trapos negros
vulto de formas imprecisas e odor quente

quis oferecer-lhe uma mão
ainda que desfalecida
ainda que cravada de sulcos fundos

-não preciso as asas chegam-me bem
ele mexeu os lábios mostrando uma fileira de dentes amarelos
tornava-se impossível respirar

olhou de novo para ela enfrentando-a
desenhou um futuro em linhas invisíveis
e cravou-lhe o punhal com mestria entre os espaços das costelas
ainda sentiu a lamina tocar-lhe no coração
[há mortes que precisam ser ensaiadas]

Fotografia de Pedro Polónio, http://club-silencio.blogspot.pt/

14 comentários:

  1. essas baladas são cenas incríveis
    acompanhadas sempre por um bom
    vinho
    ...


    beijo carinhoso,
    baby.

    ResponderEliminar
  2. Laura, que espanto: há mortes que precisam ser ensaiadas. Amplifico isso e compreendo que sim, sob vários aspectos. Uma balada tocante.
    Beijos e grata pela visita ao Roxo.

    ResponderEliminar
  3. este final, este final, este final (me atravessa)


    beijo

    ResponderEliminar
  4. Para uma morte tão bem produzida
    O ensaio é fundamental.

    ResponderEliminar
  5. E nada de final feliz nessa balada...

    ResponderEliminar
  6. ponho-me sempre na poltrona da frente ao te ler!

    beijo, poeta querida!

    ResponderEliminar
  7. Parece cena de um triller.....
    Emocionante.
    beijo

    ResponderEliminar
  8. Valha-me Zeus!!! És uma poeta espantosa.

    Beijo, Lauríssima*

    ResponderEliminar
  9. - talvez não tenha nada a ver, mas adoro interpretar, sabes bem disso, rs.

    Este seu poema me lembrou uma história, vivida há mais de 2000. Principalmente pelas dicas do catolicismo implícito.

    Grande abraço, querida Laura.

    ResponderEliminar
  10. E quantas mortes precisarão ser ensaiadas?
    Infelizmente elas vem espreitando e de repente vupt.
    Incrível esta sua inspiração.

    Um lindo dia para você.
    Beijos.

    ResponderEliminar
  11. As mortes ensaiadas são, em essência, mortes perfeitas.
    E a morte, último ato solene da vida, para que se perpetue,
    tem de ser perfeita.

    ResponderEliminar