«Escrever não é agradável. É um trabalho duro e sofre-se muito. Por momentos, sentimo-nos incapazes: a sensação de fracasso é enorme e isso significa que não há sentimento de satisfação ou de triunfo. Porém, o problema é pior se não escrever: sinto-me perdido. Se não escrever, sinto que a minha vida carece de sentido.»
de Paul Auster
"Saber que será má uma obra que se não fará nunca. Pior, porém, será a que nunca se fizer. Aquela que se faz, ao menos, fica feita. Será pobre mas existe, como a planta mesquinha no vaso único da minha vizinha aleijada. […] O que escrevo, e que reconheço mau, pode também dar uns momentos de distracção de pior a um ou outro espírito magoado ou triste. Tanto me basta, ou não me basta, mas serve de alguma maneira, e assim é toda a vida."
de Bernardo Soares

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

balada XXIV

permite-me então convidar-te
para te sentares à minha mesa
e bebermos o derradeiro copo
diferentes são os caminhos que aqui
nos trouxeram, nos abandonaram
não, não digas nada ainda
deixa que eu fale

eram muitos os dias que haviam passado
calendários não sabiam como os contar:
os dias sucediam as noites
as noites emudeciam os dias
e muitos se passaram, sem que os homens os percebessem

assim o mar continuou, vagas fortes
altas tempestades longínquas
bancos de areia assaltados
também os rios galgavam
pedras e desfiladeiros
mergulhando na sua foz obscura
a terra rompia as suas entranhas
deixando ouvir o seu grito
nas noites frias enquanto todos fingiam dormir

medrosos, caíram um por um
os homens que iam restando
do último ninguém ficou para ver o seu salto
quando os seus pés tocaram a água
uma escuridão apagou o pouco que ainda restava
não há milagres que acudam o fim
não há deuses que escrevam a crónica
pois ela encerra-se em nós e em nós continua

e agora que sabes o fim da história
posso encher-te o copo uma vez mais?

10 comentários:

  1. A vigésima quarta balada alude aos copos. é sempre no meio dos copos que a verdade vem ao de cima.

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  2. pode... é de embriaguez que o poeta precisa!

    beijo, linda!!

    Que o renovar de tempo seja generoso com tua lira!

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  3. [em silêncio,

    recolho,
    como se fosse renovo do dia.]

    um imenso abraço!

    Leonardo B.

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  4. Quantas vezes quiseres, poetisa!!!
    Beijos e um excelente 2013 para ti !

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  5. Balada do fim...e do início...
    Podes encher o copo, levanto-o... à tua poesia!

    Beijo e Bom Ano Novo!

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  6. bebo-o de um trago só. desde que não de chá azul [deixei de crer nas coisas impossíveis].

    dirty three - she has no strings, apolo. conheci-os quase que por engano [foi a ana salomé que mos apresentou, há tanto tempo...]; escutei-os imenso, na fase a-simetria das formas; hoje quase já nem me lembrava que existiam. bom recordar o que julgávamos não ter sequer existido.

    beijo, laura!

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  7. "não há deuses que escrevam a crónica
    pois ela encerra-se em nós e em nós continua"

    Essa é a verdade mais absoluta de todas.

    Bjos!

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  8. permita-me do copo o corpo e o vazio que nele habita,



    beijo

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  9. Oi Laura
    A crônica e a poesia encerra-se em você. Sim pode encher o copo. Vamos brindar.
    Bjs.

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