«Escrever não é agradável. É um trabalho duro e sofre-se muito. Por momentos, sentimo-nos incapazes: a sensação de fracasso é enorme e isso significa que não há sentimento de satisfação ou de triunfo. Porém, o problema é pior se não escrever: sinto-me perdido. Se não escrever, sinto que a minha vida carece de sentido.»
de Paul Auster
"Saber que será má uma obra que se não fará nunca. Pior, porém, será a que nunca se fizer. Aquela que se faz, ao menos, fica feita. Será pobre mas existe, como a planta mesquinha no vaso único da minha vizinha aleijada. […] O que escrevo, e que reconheço mau, pode também dar uns momentos de distracção de pior a um ou outro espírito magoado ou triste. Tanto me basta, ou não me basta, mas serve de alguma maneira, e assim é toda a vida."
de Bernardo Soares

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

cemitério XLI

[Não mais! Não mais! Que eu esqueça que te tive,
e tu me esqueças debruçado em ti!
Que tudo seja como outrora eu vi:
uma figura longe recortada...
Jorge de Sena]
  XLI 
temos de aprender a dizer adeus, abrir a mão e deixar a carne mirrar. nascemos nus, despidos de sentimentos, fraca a luz que aquece o corpo protegido. seguimos, vestimos a pele que nos oferecem, mas não temos por onde escolher. os reflexos são fracos, memórias apagadas de um presente que não se reconhece. despimos o colorido hábito com que nos ornamentam: somos cadáver à espera, à espera de aprender a dizer adeus, pois todos acabamos por descobrir que já nascemos mortos. [FIM]
 Nick Cave & The Bad Seeds - Hallelujah

7 comentários:

  1. Laurinha,

    a cada adeus morremos um pouco na espera de nós mesmos.
    Quem sabe voltaremos a nos ser..., a nos constituir:
    aquele pequeno pedaço de sobrevida que se colado novamente formará o vaso por inteiro, ainda que com fissuras, ainda que...

    Lindo!

    Beijinhos e te cuida :)

    Sempre estarei por aqui.

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  2. aprendi assim, ame-@ e deixe-@ livre

    do fim Laura, me veio Fernando Pessoa, suas pessoas seus eus, e o que somos, cadáveres adiados

    mas deixo uma de Alvaro de Campos

    "Ah, perante esta única realidade

    Ah, perante esta única realidade, que é o mistério,
    Perante esta única realidade terrível - a de haver uma realidade.
    Perante este horrível ser que é haver ser.
    Perante este abismo de existir um abismo,
    Este abismo de a existência de tudo ser um abismo,
    Ser um abismo por simplesmente ser,
    Por poder ser,
    Por haver ser!
    - Perante isto tudo como tudo o que os homens fazem,
    Tudo o que os homens dizem,
    Tudo quanto constroem, desfazem ou se constrói ou desfaz através deles,
    Se empequena!
    Não, não se empequena... se transforma em outra coisa -
    Numa só coisa tremenda e negra e impossível.
    Uma coisa que está para além dos deuses, de Deus, do Destino -
    Aquilo que faz que haja deuses e Deus e Destino,
    Aquilo que faz que haja ser para que possa haver seres,
    Aquilo que subsiste através de todas as formas,
    De todas as vidas, abstratas ou concretas,
    Eternas ou contingentes,
    Verdadeiras ou falsas!
    Aquilo que, quando se abrangeu tudo, ainda ficou fora,
    Porque quando se abrangeu tudo não se abrangeu explicar por que é um tudo,
    Por que há qualquer coisa, por que há qualquer coisa, por que há qualquer coisa!

    Minha inteligência tornou-se um coração cheio de pavor,
    E é com minhas idéias que tremo, com a minha consciência de mim.
    Com a substância essencial do meu ser abstrato
    Que sufoco de incompreensível,
    Que me esmago de ultratranscendente,
    E deste medo, desta angústia, deste perigo do ultra-ser,
    Não se pode fugir, não se pode fugir, não se pode fugir!

    Cárcere do Ser, não há libertação de ti?
    Cárcere de pensar, não há libertação de ti?

    Ah, não, nenhuma - nem morte, nem vida, nem Deus!
    Nós, irmãos gêmeos do Destino em ambos existirmos,
    Nós, irmãos gêmeos dos Deuses todos, de toda a espécie,
    Em sermos o mesmo abismo, em sermos a mesma sombra,
    Sombra sejamos, ou sejamos luz, sempre a mesma noite.
    Ah, se afronto confiado a vida, a incerteza da sorte,
    Sorridente, impensando, a possibilidade quotidiana de todos os males,
    Inconsciente do mistério de todas as coisas e de todos os gestos,
    Por que não afrontarei sorridente, inconsciente, a Morte?
    Ignoro-a? Mas que é que eu não ignoro?
    A pena em que pego, a letra que escrevo, o papel em que escrevo,
    São mistérios menores que a Morte? Como, se tudo é o mesmo mistério?
    E eu escrevo, estou escrevendo, por uma necessidade sem nada.
    Ah, afronte eu como um bicho a morte que ele não sabe que existe!
    Tenho eu a inconsciência profunda de todas as coisas naturais,
    Pois, por mais consciência que tenha, tudo é inconsciência,
    Porque é preciso existir para se criar tudo,
    E existir é ser inconsciente, porque existir é ser possível haver ser,
    E ser possível haver ser é maior que todos os Deuses."


    beijos, Laura

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  3. entre a morte do nascimento e a do derradeiro suspiro, faça-se vida em nós. afinal, há hiatos em que a simbiose corpo e espírito é mais do que coincidência.
    beijo, laura!

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  4. Não será este apego, o fio dourado do resnascimento? Não sei, só sei que morta, vivo de saudade e assim continuo.
    Muito bom vir aqui, Laura Alberto!
    Bj

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  5. Laura,
    engraçado que tenho um estudo com esta temática.
    a única coisa em que devíamos acreditar é na morte....afinal é o destino de todos nós.
    beijo.

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  6. Vamos dizendo adeus a muitas coisas ao longo da vida. E não há drama nenhum nisso.
    Mas há outras coisas que nos acompanham para sempre, aconteça o que acontecer. A essas, jamais diremos adeus...
    Beijo, querida amiga Laura.

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  7. nossa morte se anuncia em nosso primeiro grito...

    Beijinho, Laurinha!

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