«Escrever não é agradável. É um trabalho duro e sofre-se muito. Por momentos, sentimo-nos incapazes: a sensação de fracasso é enorme e isso significa que não há sentimento de satisfação ou de triunfo. Porém, o problema é pior se não escrever: sinto-me perdido. Se não escrever, sinto que a minha vida carece de sentido.»
de Paul Auster
"Saber que será má uma obra que se não fará nunca. Pior, porém, será a que nunca se fizer. Aquela que se faz, ao menos, fica feita. Será pobre mas existe, como a planta mesquinha no vaso único da minha vizinha aleijada. […] O que escrevo, e que reconheço mau, pode também dar uns momentos de distracção de pior a um ou outro espírito magoado ou triste. Tanto me basta, ou não me basta, mas serve de alguma maneira, e assim é toda a vida."
de Bernardo Soares

quinta-feira, 12 de junho de 2014

Balada XXIX

[balada para a mãe que tenho]

nunca me apercebi que
as flores brotassem por esta altura,
as flores do vaso que sempre disseste
que iria morrer cedo
nunca vi, talvez nunca as quisesse ver
da mesma forma que não vejo as rugas
que no teu rosto se acumulam
da mesma forma que minimizo
o cansaço de que falas
e obrigo que sejas
aquela menina nas fotografias de família
em aniversários, férias
a mãe de cabelo curto e ruivo

quando para ti olho
o que vejo é a mãe de uma menina
que brincava e sonhava com a vida que viria
não te quero ver assim
não te quero sentir assim
então engano-me a mim e a ti
já não vivemos nessas fotografias
já não existem os negativos
vejo me ao espelho, tal como sou
a envelhecer, a crescer
como nunca julguei que o faria
e vejo-te a ti como sempre

e para toda a eternidade que a vida me der

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