«Escrever não é agradável. É um trabalho duro e sofre-se muito. Por momentos, sentimo-nos incapazes: a sensação de fracasso é enorme e isso significa que não há sentimento de satisfação ou de triunfo. Porém, o problema é pior se não escrever: sinto-me perdido. Se não escrever, sinto que a minha vida carece de sentido.»
de Paul Auster
"Saber que será má uma obra que se não fará nunca. Pior, porém, será a que nunca se fizer. Aquela que se faz, ao menos, fica feita. Será pobre mas existe, como a planta mesquinha no vaso único da minha vizinha aleijada. […] O que escrevo, e que reconheço mau, pode também dar uns momentos de distracção de pior a um ou outro espírito magoado ou triste. Tanto me basta, ou não me basta, mas serve de alguma maneira, e assim é toda a vida."
de Bernardo Soares

terça-feira, 12 de março de 2013

esventrado XXVIII


espreita do outro lado da janela
com dentes cariados e hálito pérfido
marca os segundos no vidro embaciado
deixando o riso escapar

fecho os olhos e vejo
cerro os dentes e falo

ah, maldito sejas tu
com tuas vestes brancas
com tua voz de candura
torcendo os ponteiros
ameaçando a carne que envelhece

cubro o corpo e tremo de frio
esqueço o tempo e as pragas cumprem-se

tira-me as medidas
compra-me um belo par de sapatos
tece-me o fato que sonhaste
prende os pregos nas tábuas lisas de pinho
pois sabes bem que daqui não me é possível sair

[no fundo todos estamos realmente frios]

Fotografia de Pedro Polónio, http://club-silencio.blogspot.pt/

8 comentários:

  1. Continuas a esventrar... e bem...
    Mais um magnífico poema.
    Um beijo, querida amiga.

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  2. neste inferno gélido pairam as sombras desgarradas dos dias, um rosto ou um corpo que se despedaça,



    beijoooos

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  3. Sim... não há calor que fraqueje a desesperança.

    Ótimo, Laura.

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  4. é isso, todos nós caminhamos para o mesmo destino, o beco! haverá saída?

    bj, minha poeta tão gostada

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  5. laura, incrível o poema. estou encantado.

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  6. frios e silenciosos...
    esplêndido poema...

    beijo carinhoso.

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  7. Laura,
    A lucidez dói, e tu és muito lúcida.

    Beijo :)

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  8. Seus esventrados me deixaram no vazio.

    Bjs.

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