«Escrever não é agradável. É um trabalho duro e sofre-se muito. Por momentos, sentimo-nos incapazes: a sensação de fracasso é enorme e isso significa que não há sentimento de satisfação ou de triunfo. Porém, o problema é pior se não escrever: sinto-me perdido. Se não escrever, sinto que a minha vida carece de sentido.»
de Paul Auster
"Saber que será má uma obra que se não fará nunca. Pior, porém, será a que nunca se fizer. Aquela que se faz, ao menos, fica feita. Será pobre mas existe, como a planta mesquinha no vaso único da minha vizinha aleijada. […] O que escrevo, e que reconheço mau, pode também dar uns momentos de distracção de pior a um ou outro espírito magoado ou triste. Tanto me basta, ou não me basta, mas serve de alguma maneira, e assim é toda a vida."
de Bernardo Soares

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

como o céu se desmorona em segundos inúteis a meus pés

hoje o céu olha-me com um ar jocoso, até a própria lua arreganha os dentes aguçados entre densas nuvens que a ocultam
e chove, tal como ontem choveu, e anteontem, e antes de anteontem, tal como amanhã irá chover e esta cruel realidade impede-me de contar o tempo

caminho, sei que caminho porque os pés se arrastam no alcatrão molhado, todos se afastam em figuras de contornos escuros, primeiro perfeitamente definidos e depois esbatidos, quero olhá-los, senti-los, dizer-lhes: estou aqui, mas somem-se entre os olhos cansados

ultimamente tenho a companhia das sombras que nascem na ponta dos sapatos e se estendem em fantasmas que assombram as próprias valetas, também elas habituadas à escuridão, aos escarros, ao lixo, ao sangue infecto

eu tenho uma navalha no bolso e não tenho coragem de a usar
eu tenho uma navalha no bolso e está cheia de ferrugem
eu tenho uma navalha no bolso e não sei onde a perdi


Sigur Ros - Gong

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